Equação diferencial ordinária de primeira ordem

Uma equação diferencial ordinária de primeira ordem é uma equação diferencial ordinária da seguinte forma:

  • d x d t = f ( x , t ) , t D {\displaystyle {\frac {dx}{dt}}=f(x,t),t\in D\,}

onde f ( x , t ) {\displaystyle f(x,t)\,} é dada e a incógnita é a função x ( t ) {\displaystyle x(t)\,} . O domínio D {\displaystyle D\,} pode ser um intervalo ou a reta real inteira.

Quando a função f ( x , t ) {\displaystyle f(x,t)\,} não depende explicitamente sobre a variável independente t {\displaystyle t\,} e o problema pode ser escrito na seguinte forma:

  • d x d t = f ( x ) , t D {\displaystyle {\frac {dx}{dt}}=f(x),t\in D\,}

então diz-se que se trata de um sistema autônomo de primeira ordem.

Exemplos

Equação Solução Domínio
d x d t = t {\displaystyle {\frac {dx}{dt}}=t\,} x ( t ) = t 2 2 + C {\displaystyle x(t)={\frac {t^{2}}{2}}+C\,} t R {\displaystyle t\in \mathbb {R} }
d x d t = x {\displaystyle {\frac {dx}{dt}}=x\,} x ( t ) = C e t {\displaystyle x(t)=Ce^{t}\,} t R {\displaystyle t\in \mathbb {R} }
d x d t = x t {\displaystyle {\frac {dx}{dt}}=xt\,} x ( t ) = C e t 2 / 2 {\displaystyle x(t)=Ce^{t^{2}/2}\,} t R {\displaystyle t\in \mathbb {R} }
d x d t = x 2 {\displaystyle {\frac {dx}{dt}}=x^{2}\,} x ( t ) = 1 C t {\displaystyle x(t)={\frac {1}{C-t}}\,} t R { C } {\displaystyle t\in \mathbb {R} \backslash \{C\}}

Em todos os casos a constante de integração C {\displaystyle C\,} é arbitrária

O problema de valor inicial

O problema de valor inicial para a equação diferencial ordinária de primeira ordem consiste em encontrar a função x ( t ) {\displaystyle x(t)\,} que satisfaz a equação diferencial dada e assume a condição inicial no ponto inicial do intervalo:

  • { d x ( t ) d t = f ( x , t ) ,       x > t 0 x ( t 0 ) = u 0 {\displaystyle \left\{{\begin{array}{rcl}{\frac {dx(t)}{dt}}&=&f(x,t),~~~x>t_{0}\\x(t_{0})&=&u_{0}\end{array}}\right.}

Exemplo

  • { d x ( t ) d t = x ,       t > 0 x ( t = 0 ) = 1 {\displaystyle \left\{{\begin{array}{rcl}{\frac {dx(t)}{dt}}&=&x,~~~t>0\\x(t=0)&=&1\end{array}}\right.}

A (única) solução desta equação diferencial é dada por

  • x ( t ) = e t {\displaystyle x(t)=e^{t}\,}

O teorema de Picard-Lindelöf

Ver artigo principal: Teorema de Picard-Lindelöf

O teorema de Picard-Lindelöf estabelece a existência e unicidade de soluções em uma vizinhança de t 0 {\displaystyle t_{0}\,} para o problema de valor inicial:

d d t x ( t ) = f ( x ( t ) , t ) x ( t 0 ) = x 0 {\displaystyle {\begin{array}{ll}{\frac {d}{dt}}x(t)=f(x(t),t)\\x(t_{0})=x_{0}\end{array}}\,}

onde f ( x , t ) {\displaystyle f(x,t)\,} é uma função contínua na variável t {\displaystyle t\,} e Lipschitz contínua na variável x {\displaystyle x\,} .

O problema de valores contorno

O problema de valores de contorno para a equação diferencial ordinária de primeira ordem consiste em encontrar a função x ( t ) {\displaystyle x(t)\,} que satisfaz a equação diferencial dada em um intervalo [ t 0 , t 1 ] {\displaystyle [t_{0},t_{1}]\,} e cujos valores nos extremos t 0 {\displaystyle t_{0}\,} e t 1 {\displaystyle t_{1}\,} satisfazem uma condição dada:

  • { d x ( t ) d t = f ( x , t ) ,       x > t 0 B ( x ( t 0 ) , x ( t 1 ) ) = 0 {\displaystyle \left\{{\begin{array}{rcl}{\frac {dx(t)}{dt}}&=&f(x,t),~~~x>t_{0}\\B(x(t_{0}),x(t_{1}))&=&0\end{array}}\right.}

Exemplo

  • { d x ( t ) d t = x ,       t > 0 x ( 0 ) 2 x ( 1 ) = 1 {\displaystyle \left\{{\begin{array}{rcl}{\frac {dx(t)}{dt}}&=&x,~~~t>0\\x(0)-2x(1)&=&1\end{array}}\right.}

A (única) solução desta equação diferencial é dada por

  • x ( t ) = e t 1 2 e {\displaystyle x(t)={\frac {e^{t}}{1-2e}}\,}

Equação linear

O caso linear acontece quando a função f ( x , t ) {\displaystyle f(x,t)\,} é da seguinte forma:

  • f ( x , t ) = ϕ ( t ) + x ψ ( t ) {\displaystyle f(x,t)=\phi (t)+x\psi (t)\,}

A equação fica, então:

  • d x ( t ) d t x ( t ) ψ ( t ) = ϕ ( t ) {\displaystyle {\frac {dx(t)}{dt}}-x(t)\psi (t)=\phi (t)\,}

Esta equação pode ser resolvida multiplicando pelo fator integrante:

  • ( d x ( t ) d t x ( t ) ψ ( t ) ) e 0 t ψ ( τ ) d τ = ϕ ( t ) e 0 t ψ ( τ ) d τ {\displaystyle \left({\frac {dx(t)}{dt}}-x(t)\psi (t)\right)e^{-\int _{0}^{t}\psi (\tau )d\tau }=\phi (t)e^{-\int _{0}^{t}\psi (\tau )d\tau }\,}
  • d d t ( x ( t ) e 0 t ψ ( τ ) d τ ) = ϕ ( t ) e 0 t ψ ( τ ) d τ {\displaystyle {\frac {d}{dt}}\left(x(t)e^{-\int _{0}^{t}\psi (\tau )d\tau }\right)=\phi (t)e^{-\int _{0}^{t}\psi (\tau )d\tau }\,}

então, integrando, temos:

  • x ( t ) e 0 t ψ ( τ ) d τ = x ( 0 ) + 0 t ϕ ( s ) e 0 s ψ ( τ ) d τ d s {\displaystyle x(t)e^{-\int _{0}^{t}\psi (\tau )d\tau }=x(0)+\int _{0}^{t}\phi (s)e^{-\int _{0}^{s}\psi (\tau )d\tau }ds\,}

ou, equivalentemente:

  • x ( t ) = x ( 0 ) e 0 t ψ ( τ ) d τ + 0 t ϕ ( s ) e s t ψ ( τ ) d τ d s {\displaystyle x(t)=x(0)e^{\int _{0}^{t}\psi (\tau )d\tau }+\int _{0}^{t}\phi (s)e^{\int _{s}^{t}\psi (\tau )d\tau }ds\,}

Equações de variáveis separáveis

Uma equação é designada de variáveis separáveis, se puder ser escrita na forma: [1]

d y d x = f ( x ) g ( y ) {\displaystyle {dy \over dx}={\frac {f(x)}{g(y)}}}

Para resolver este tipo de equação primeiro observemos que a primitiva da função g ( y ) {\displaystyle g(y)} pode ser calculada da seguinte forma

g ( y ) d y = g ( y ( x ) ) d y d x d x {\displaystyle \int g(y)dy=\int g(y(x)){dy \over dx}dx}

A equação diferencial pode ser escrita como

g ( y ) d y d x = f ( x ) {\displaystyle g(y){dy \over dx}=f(x)}

e a primitiva em ordem a x {\displaystyle x} do lado esquerdo é igual à primitiva em ordem a y {\displaystyle y} de g ( y ) {\displaystyle g(y)} como acabamos de ver

g ( y ) d y = f ( x ) d x + c {\displaystyle \int g(y)dy=\int f(x)dx+c}

As equações do tipo

d y d x = f ( a x + b y + c ) {\displaystyle {dy \over dx}=f(ax+by+c)}

onde a {\displaystyle a} e b {\displaystyle b} são constantes, não são equações de variáveis separáveis, mas podem ser reduzidas a elas por meio da seguinte substituição[1]

v = a x + b y + c d v d x = a + b d y d x {\displaystyle v=ax+by+c\qquad \Longrightarrow \qquad {dv \over dx}=a+b{dy \over dx}}

Equações exatas

Qualquer equação de primeira ordem pode ser escrita em forma diferencial:[1]

M ( x , y ) d x + N ( x , y ) d y = 0 {\displaystyle M(x,y)dx+N(x,y)dy=0}

esta forma é semelhante à expressão da diferencial de uma função de duas variáveis

d F ( x , y ) = F x d x + F y d y {\displaystyle dF(x,y)={\partial F \over \partial x}dx+{\partial F \over \partial y}dy}

Esta equação sugere-nos admitir que existe uma função F ( x , y ) {\displaystyle F(x,y)} cujas derivadas parciais são iguais a M ( x , y ) {\displaystyle M(x,y)} e N ( x , y ) {\displaystyle N(x,y)} .[1] No entanto, a segunda derivada parcial de F {\displaystyle F} seria

2 F x 2 y = M y = N x {\displaystyle {\frac {\partial ^{2}{F}}{\partial x^{2}}}y={\partial M \over \partial y}={\partial N \over \partial x}}

Assim, para que a conjetura da existência da função F ( x , y ) {\displaystyle F(x,y)} seja consistente, é necessário que as funções M {\displaystyle M} e N {\displaystyle N} verifiquem a seguinte condição

M y = N x {\displaystyle {\partial M \over \partial y}={\partial N \over \partial x}}

nesse caso diz-se que a equação é uma equação exata e pode ser escrita como

d F ( x , y ) = 0 {\displaystyle dF(x,y)=0}

sendo a sua solução geral

F ( x , y ) = c {\displaystyle F(x,y)=c}

A função F {\displaystyle F} calcula-se encontrando a função cujas derivadas parciais sejam iguais a M ( x , y ) {\displaystyle M(x,y)} e N ( x , y ) {\displaystyle N(x,y)} .[1]

Equações homogêneas

Uma equação de primeira ordem diz-se homogénea se tiver a seguinte forma geral[1]

d y d x = f ( y x ) {\displaystyle {dy \over dx}=f{\bigg (}{\frac {y}{x}}{\bigg )}}

para resolver este tipo de equação usa-se a substituição

v = y x d y d x = v + x d v d x {\displaystyle v={\frac {y}{x}}\qquad \Longrightarrow \qquad {dy \over dx}=v+x{dv \over dx}}

a qual transforma a equação numa equação de variáveis separáveis. Para reconhecer facilmente se uma função racional é da forma f ( y / x ) {\displaystyle f(y/x)} observam-se os expoentes de cada termo no numerador e denominador (soma do expoente de x {\displaystyle x} mais o expoente de y {\displaystyle y} ) os quais deverão ser iguais. Por exemplo das duas funções seguintes a primeira tem a forma f ( y / x ) {\displaystyle f(y/x)} mas a segunda não

x y 2 x 3 y x 2 x y + y 2 + x {\displaystyle {\frac {xy^{2}-x^{3}}{yx^{2}}}\qquad {\frac {xy+y}{2+x}}}

Existem outras equações que podem ser reduzidas a equações homogêneas. Um exemplo típico é a equação

d y d x = f ( a x + b y + c p x + q y + r ) {\displaystyle {dy \over dx}=f{\bigg (}{\frac {ax+by+c}{px+qy+r}}{\bigg )}}

onde a , b c , p , q {\displaystyle a,bc,p,q} e r {\displaystyle r} são constantes dadas.[1] Se as constantes c {\displaystyle c} e r {\displaystyle r} fossem nulas, a equação seria homogênea; definimos um novo sistema de coordenadas ( u , v ) {\displaystyle (u,v)} para substituir ( x , y ) {\displaystyle (x,y)} , de forma a obter

a x + b y + c = a u + b v p x + q y + r = p u + q v {\displaystyle {\begin{aligned}ax+by+c&=&au+bv\\px+qy+r&=&pu+qv\end{aligned}}}

ou de forma equivalente

a ( x u ) + b ( y v ) = c p ( x u ) + q ( y v ) = r {\displaystyle {\begin{aligned}\color {Red}{a(x-u)+b(y-v)=-c}\\\color {Blue}{p(x-u)+q(y-v)=-r}\end{aligned}}}

a solução deste sistema de equações lineares pode ser obtido por meio da regra de Cramer

x u = | c b r q | | a b p q | y v = | a c p r | | a b p q | {\displaystyle x-u={\frac {\left|{\begin{array}{rr}-c&b\\-r&q\end{array}}\right|}{\left|{\begin{array}{rr}a&b\\p&q\end{array}}\right|}}\qquad y-v={\frac {\left|{\begin{array}{rr}a&-c\\p&-r\end{array}}\right|}{\left|{\begin{array}{rr}a&b\\p&q\end{array}}\right|}}}

como os lados direitos da equação e da equação são constantes, também temos que d x = d u {\displaystyle dx=du} , d y = d v {\displaystyle dy=dv} e a equação diferencial transforma-se numa equação homogênea

d v d u = f ( a u + b v p u + q v ) {\displaystyle {dv \over du}=f\left({\frac {au+bv}{pu+qv}}\right)}

Não-unicidade de soluções

Algumas equações diferenciais ordinárias de primeira ordem admitem duas soluções distintas que satisfazem a mesma condição inicial. Um exemplo simples de um equação que apresenta esse fenômeno é seguinte:

d x d t = x ,   t > 0 x ( 0 ) = 0 {\displaystyle {\begin{array}{l}{\frac {dx}{dt}}={\sqrt {x}},~t>0\\x(0)=0\end{array}}\,}

Esta admite como solução qualquer função da seguinte forma:

x ( t ) = 0 , 0 t t 0 x ( t ) = t 2 4 , t 0 {\displaystyle {\begin{array}{lclc}x(t)&=&0,&0\leq t\leq t_{0}\\x(t)&=&{\frac {t^{2}}{4}},&t\geq 0\end{array}}\,}

aqui t 0 {\displaystyle t_{0}\,} é uma constante positiva qualquer.

Divergência em tempo finito

Algumas equações diferenciais ordinárias de primeira ordem apresentam uma solução que diverge em tempo finito. Um exemplo é a seguinte equação:

d x d t = x 2 ,   t > 0 x ( 0 ) = 1 {\displaystyle {\begin{array}{l}{\frac {dx}{dt}}=x^{2},~t>0\\x(0)=1\end{array}}\,}

Esta admite como solução qualquer função da seguinte forma:

x ( t ) = 1 1 t , 0 t < 1 {\displaystyle x(t)={\frac {1}{1-t}},0\leq t<1\,}

Referências

  1. a b c d e f g Villate, Jaime E. (2011). Equações Diferenciais e Equações de Diferenças (PDF). Porto: [s.n.] 120 páginas. Consultado em 13 de julho de 2013 

Ver também

  • Retrato de fase

Ligações externas

  • Eric W. Weisstein, First-Order Ordinary Differential Equation no MathWorld.
  • v
  • d
  • e
Sistema de equações diferenciais
Equações diferenciais
parciais
Métodos analíticos
Métodos numéricos
Pessoas
Outros